MPT-RS promove capacitação para rede de atendimento às vítimas de escravidão contemporânea
Iniciativa foi voltada a agentes da rede de assistência social e da saúde do Rio Grande do Sul
O Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT-RS) realizou na tarde desta quinta-feira (7/11), capacitação sobre trabalho escravo contemporâneo voltada à rede de assistência social e saúde do Rio Grande do Sul. O evento é iniciativa da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (Conaete) do MPT e aconteceu no Auditório Ruy Cirne Lima da Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho (TRT-4).
O projeto foi idealizado pelo MPT e já teve três edições realizadas anteriormente. Ele visa preparar agentes públicos envolvidos no fluxo de atendimento às vítimas de escravidão contemporânea, para fins de acolhimento e encaminhamento de soluções para a situação de muitos trabalhadores que continuam em situações de vulnerabilidade mesmo após resgatados. Tem como propósito, também, sensibilizar os agentes para possíveis situações de trabalho análogo ao de escravo que perpassem sob sua atuação, havendo a necessidade de uma escuta qualificada por parte dos agentes.
As Procuradoras Franciele D’Ambros e Laura Valença, Coordenadora e Vice-Coordenadora da Conaete no RS, respectivamente, iniciaram o evento apresentando os conceitos jurídicos chave para a compreensão do tema, como trabalho forçado, jornada exaustiva, servidão por dívidas e condição degradante de trabalho. “Geralmente a coação ao trabalhador é psicológica: ameaça de perseguição à família, uma indução da ideia de que aquele trabalhador não tem alternativa”, destacou a Procuradora Laura. “Muitas vezes a prestação do serviço é em troca de comida e de um teto sob o qual dormir”. Ela também alertou para a necessidade de estar atento a sinais de vulnerabilidade que podem levar o trabalhador a ser submetido ao trabalho escravo.
A Procuradora Franciele apresentou as atribuições institucionais e os objetivos institucionais do MPT e da própria Conaete, bem como os instrumentos utilizados para a atuação do MPT, como o inquérito civil, o termo de ajuste de conduta e a ação civil pública, bem como explanou como a instituição atua antes, durante e depois das operações ficais. Ela destaca que os sistemas de saúde e assistência social são essenciais no pós-resgate. “Nem todas as histórias têm finais felizes. Muitas vezes, não há para onde este trabalhador retornar, e ele precisa de acolhimento, de uma nova inserção no mercado de trabalho”, afirmou.
Em seguida, foi apresentado o Fluxo de Atendimento às Vítimas de Trabalho Escravo pelas servidoras Livia Biasuz Machado e Andréia Campos, da Secretaria Estadual de Saúde, e Tassiane Lemos Pacheco, da Secretaria de Desenvolvimento Social. Elas ofereceram maiores detalhes sobre o atendimento de pessoas resgatadas do ponto de vista dos profissionais da Saúde e dos servidores da assistência social, e as atribuições das Secretarias, suas estruturas, instituições integrantes e em que pontos se complementam.
A Auditora-Fiscal do Trabalho Lucilene Pacini, por sua vez, apresentou detalhes da recepção e tratamento de denúncias e da organização de forças-tarefas interinstitucionais responsáveis pela apuração e eventual resgate de pessoas da situação de trabalho escravo. Também falou de casos concretos e suas peculiaridades, estatísticas sobre setores econômicos, ocupações, origens, e um panorama dos resgates no Estado. “São dois os principais perfis dos resgatados: o que migra e é explorado, geralmente em atividades temporárias e sazonais; e o daqueles que não conseguem mais sair da situação de exploração, em que ocorre geralmente o resgate de apenas um trabalhador, que já perdeu laços com a família, como o trabalho doméstico”, resumiu.
Os gestores regionais do Programa Nacional de Enfrentamento ao Trabalho Escravo e ao Tráfico de Pessoas e de Proteção ao Trabalho do Migrante no TRT-4, Desembargador Manuel Cid Jardon e Juiz do Trabalho Charles Lopes Kuhn, falaram em seguida sobre a integração do Poder Judiciário como sujeito ativo no enfrentamento ao trabalho escravo, ao tráfico de pessoas e de proteção ao trabalho do migrante.
O desembargador Manuel Jardon falou sobre a criação do programa em 2023 pela Justiça do Trabalho e sobre o Protocolo para Atuação e Julgamento com Perspectiva de Enfrentamento do Trabalho Escravo Contemporâneo, que busca promover maior sensibilidade dos membros da magistratura para o tema. “A nova função do Judiciário é ser proativo e ir à sociedade. Essa mudança fará muita diferença”, resumiu.
O juiz Charles Khun enfatizou a complexidade da matéria, apreciada por vários ramos do Judiciário, e a necessidade de a Justiça do Trabalho aplicar também princípios e regramentos internacionais além da legislação brasileira específica. “É importante vermos além do caso concreto, para a realidade social e econômica”, concluiu.
Ao final, os painelistas puderam dialogar e responder dúvidas dos participantes.
A primeira edição do seminário foi realizada em março de 2021, para redes de assistência de oito municípios. A segunda, promovida em julho de 2022, abrangeu três dezenas de municípios, além de agentes das polícias Civil e Rodoviária Federal. A terceira, em abril de 2023, contou com a participação de 150 pessoas. A edição de 2024 também incluiu agentes das Secretarias de Saúde municipais. O objetivo é formar um número cada vez maior de agentes aptos a realizar o encaminhamento de vítimas de exploração laboral, tanto em serviços rurais quanto urbanos.
Mesa de abertura
A mesa de abertura do evento contou com a presença da Vice-Procuradora-Chefe do MPT-RS, Martha Diverio Kruse; do Vice-Presidente TRT-4, Alexandre Corrêa da Cruz; do Coordenador da Comissão Estadual para Erradicação do Trabalho Escravo (Coetrae), Wellington Luis Xavier Mancilha; do Chefe da Seção de Fiscalização da Superintendência Regional do Trabalho (SRTE), Gerson Soares Pinto; e da Coordenadora da Conaete-RS, Franciele D’Ambros.
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